comuna intergaláctica II
Manifesto Terracosmista
Programação
Debates
Nave Espacial de Bambu
Extremophilia
Quem

Comuna Intergaláctica é um Festival de Arte e Ciências Espaciais que tem como vívido interesse promover troca de conhecimentos, aprofundamento investigativo, criação de redes de interesse sobre Terra/Cosmos, conectando cientistas, artistas, pensadores, interessados em geral nas questões que envolvem o futuro da Terra e os atuais projetos sobre e no espaço, desde a perspectiva dos países periféricos.

O Festival surgiu de dentro de inúmeras redes voltadas para o campo da cultura livre, do software livre, do movimento dos sem satélites, da arte eletrônica, que acontecem desde o final do século XX e atravessa o início do século XXI com inúmeros encontros nacionais e internacionais de arte, ciência e tecnologia.

Criado por Fabiane Borges, o 1º Festival Comuna Intergaláctica ocorreu em 2017 no Observatório do Valongo, no Rio de Janeiro, e teve a organização de Fabiane Borges e Paula Scamparini. 

A segunda edição do Festival Comuna Intergaláctica teve a direção de Fabiane Borges e Eduardo Duwe e ocorreu no Planetário do Parque do Ibirapuera, em seu prédio anexo (EMA) - Escola Municipal de Astronomia e na Praça Rosa dos Ventos nos dias 15, 16, 21, 22 e 23 de setembro.

Durante esses 09 dias celebramos o Equinócio de Primavera com o tema terracosmismo, que é a junção do perspectivismo terrano com o imaginário cosmista com palestras, debates, laboratórios, residências artísticas, oficinas, observação celeste, exposição de arte, projeções em fulldome, performance, rituais, celebrações entre outras coisas.

CARRO NO ESPAÇO, CORRIDA ESPACIAL
NA PUBLICIDADE

No começo do ano de 2018 fomos surpreendidos com o lançamento de um carro na órbita heliocêntrica. Como na animação “Heavy Metal” (1981), uma audiência mundial acompanhou ao vivo durante 04 horas a viagem espacial do conversível vermelho de 100.000 dólares “pilotado” por um manequim nomeado Starman, ao som da canção Space Oddity de David Bowie. Isso foi um teste para o foguete Falcon Heavy, com o qual a SpaceX pretende levar satélites para o espaço. Mas foi sobretudo uma grande jogada de marketing.

Apesar do interesse mundial pelo fato, essa não foi a primeira ação de marketing “estratosférica”, anteriormente já houveram outras, no entanto nenhuma dessas ações foi tão espetacular e ideológica. Assim como a bandeira americana na Lua representou simbolicamente a vitória do Imperialismo Americano, o conversível elétrico de Musk marca outro momento histórico - a hegemonia das corporações e seu projeto universal. Da nostalgia das estrelas à midiatização cósmica, 2018 deflagra uma nova corrida espacial, a da máquina publicitária.

Nessa nova corrida se atualiza uma guerra de ontologias: cada foguete levará para o Universo suas cargas ideológicas e essas perspectivas de mundo ocuparão paulatinamente as curvaturas celestes, enquanto produzirão narrativas sobre a história pregressa da humanidade, assim como anunciarão seus projetos de futuro. 

A Comuna Intergaláctica quer participar dessas narrativas sobre o Espaço desde o ponto de vista dos trópicos, trazendo à tona todo tipo de ideias comunais, modos de vida pensados/testados na Terra, não se detendo aos paradigmas dos programas corporativos de exploração espacial, nem vendo o céu só como potencial campo de extração de recursos naturais, nem reproduzindo a ideologia colonial imperialista baseada na lei dos mais fortes, mas preferindo potencializar possibilidades híbridas das novas e antigas sociedades imaginárias, atualizando estas propostas, trazendo um arsenal ontológico comunal, surfando na onda de uma contracultura espacial que vem se formando a partir de condições periféricas, que se confronta diariamente com os efeitos coloniais na estrutura dos seus projetos espaciais, que se manifestam em sua falta de autonomia, sua falta de representatividade, sua subjugação aos países ricos ou aos programas corporativos, mas que mesmo assim promovem alguma autonomia, seja lançando satélites, fazendo protótipos de foguetes, hackeando satélites obsoletos, construindo plataformas colaborativas de ocupações espaciais, ou pelo menos imaginando tudo isso.

Enquanto questionamos ética e esteticamente as atuais ocupações celestes, oferecemos como contraponto articulações entre os campos de pesquisa em arte, ciência e tecnologia, propondo caminhos convergentes entre esses domínios, com projetos concretos de produção científica e produção narrativa, com a intenção evidente de promover as tecnologias livres, estimulando a produção científica e tecnológica nos espaços sociais, alavancando a ideia da importância do amplo investimento e acesso às pesquisas tecnológicas e humanas.

O EQUINÓCIO DO NOVO TEMPO

A Comuna celebra o equinócio, o início de um novo ciclo planetário celebrado por muitas culturas antigas, onde a chegada da primavera simboliza o fim do ciclo de recolhimento e a chegada do ciclo da abundância, quando ressurgem as utopias, renascem as visões exuberantes. É o Ara Pyau da cultura tupi-guarani, a época da caça, da pesca, da plantação, da colheita e dos ritos religiosos, a fase de preparação para o “novo tempo”.

Destacamos as cosmologias tradicionais como fundamentais aos propósitos da Comuna Intergaláctica, pois apesar do sequestro necropolítico promovido pelas práticas coloniais e religiosas muitas delas conseguiram sobreviver na constituição cultural desses povos, na sua memória e também nos estudos arqueológicos. Conhecimentos esses desperdiçados pelos projetos modernos (considerados supersticiosos ou irrelevantes), mas retomados com força no Antropoceno, quando necessitamos acionar conhecimentos recônditos sobre modos de vida, perspectivismos, outros paradigmas tecnológicos, imaginários cósmicos e relações com o céu.

Queremos discutir o Antropoceno, a partir das zonas de sacrifícios ecológicos, miserabilização social e de catástrofes climáticas e humanas. É a partir desse olhar cósmico mas também terrestre, que articulamos uma contracultura espacial, convocando as subjetividades dissidentes, afrofuturistas, exopunks, refugiados intergalácticos, exo-utopistas, queers cósmicos, transfeministas siderais, ficcionalistas, assim como evocando os futuros ancestrais desperdiçados pela história moderna.

Tentamos participar no processo de atualização dessas memórias do futuro a partir da produção de territórios subjetivos, investindo nas relações micropolíticas como base da sustentação do desejo, no mergulho nas redes de inconsciente, nas conexões oníricas, na reconstituição dos ideais perdidos, na ativação dos corpos em seu estado de graça, de luta. Isso pode nos levar a desejar, por exemplo, um novo fazer científico cuja estrutura competitiva e desenvolvimentista, pode dar lugar a uma estrutura colaborativa e comunitária, que só depende da capacidade de extensão dessas alianças.

Por fim a Comuna Intergaláctica se debruça sobre um Terracosmismo político e poético, lançando-se como movimento contracultural, que quer contribuir para a preparação das novas ocupações terranas e cósmicas comprometidas com seus povos e sua diversidade.

MANIFESTO TERRACOSMISTA



I
Nós, terranos, habitamos uma espaçonave em plena viagem pelo universo, a girar ao redor do Sol, que por sua vez realiza o mesmo movimento em torno de outros astros, em um sistema complexo de interconexões siderais: nossa experiência de mundos é um viagem pelo espaço, bem como pelo tempo, e desta condição nunca poderemos esquecer.

II
Buscamos a ancestralidade do planeta Terra, reiterando a compreensão de que somos formados por pó de estrelas cujas existências nos excedem. Trazemos em nossa carga genéticaas infinitas interações intergalácticas e, orbitando por entre gravidade, somos a um só tempo, terranos e cosmistas.

III
Queremos atingir a singularidade terracosmista. Confiamos no múltiplo que a ciência e a tecnologia são capazes de produzir, sem univocidade. Não seremos indivíduos  atrelados auma corporação, mas incorporados da diversidade de múltiplas galáxias. Seremos honestos em relação à vida e próximos à nossa potência de interação e criação de mundos.

IV
Gostamos da experiência do nomadismo por entre comunas, dos coletivos de mutualismo simbiótico, das redes de proteção interdependente. Acreditamos que ninguém é obrigado a viver, ou morrer, juntos mas cremos na habilidade de existir com os outros. Não confiamos em estados totalitários nem em deuses impostos e viveremos como anarcomunais.

V
Estamos criptoparanóicos com tecnologias que emulam a divindade à imagem e semelhança do sapiens fascista, imitando sobretudo suas três características  máximas: onipresença, onipotência e onisciência. Objetivamos inteligências artificiais (IAs) vinculadas a conhecimentos panteístas, ao invés do controle absoluto, onde não há espaço para a liberdade.

VI
Rechaçamos a aceleração exagerada, obstáculo para a experiência das diversas  percepções temporais e distintas temporalidades possíveis. Almejamos ser senhores de nossos próprios tempos, com a tranquilidade de quem concebe sua existência na   complexidade. Desaceleracionistas, lutamos pelo fim da escassez do tempo e, assim, iremos além.

VII
Enquanto panspermianos animistas, não só nos sabemos matéria em movimento, como também da subjetividade vibratória e comunicante que compõem tudo o que existe.
Confiamos na linguagem extremofílica, admirando os sobreviventes dos fins de mundos. Universos afora, faremos planetas exuberantes e interagentes como um dia foi a Terra.

VIII
Meteoros, ao colidirem com a Terra, fundem-se com os elementos que aqui encontram, produzindo novos materiais até então inexistentes neste planeta (ou aceleram processos de formação de outras matérias, como a dos diamantes). Como  nós,  estes corpos celestes originários de explosões estelares são constituídos da  incessante fusão de forças internas e externas que, em  constante  transformação,  impactam-se. 
Nós, como todos os outros seres desse multiverso, resultamos da interação entre tudo e o todo. Somos Impactitos.

Nave Espacial de Bambu

Durante o Festival Comuna Intergaláctica II no equinócio de 2018 no Planetáriodo Ibirapuera, lançamos a Nave de Bambu Espacial, uma “nave intergaláctica”feita de bambu e plantas, obra tema do Festival.

A Nave foi construída pelo artista Peetssa e carregou em seu bojo sementes nativas e em seu centro uma “cápsula de sonhos”, feita a partir de um manzuá, ou seja, uma armadilha tradicional de pesca e sementes de plantas nativas, e que foi concebida em uma oficina de imaginação ministrada por Eduardo Duwe e as lideranças do Quilombo de Alcântara, comunidade vizinha a Base de Lançamento de Foguetes de Alcântara, no Maranhão.



O quilombo de Alcântara vive desde o início dos anos 80 em conflito com aBase de Lançamento, a qual foi instalada em seu território e impediu o acessoao mar a parte da comunidade de pescadores, os expulsando para o interior,longe de suas atividades tradicionais.

Assim, a cada novo lançamento de foguete na Base, a comunidade revive ostraumas passados e ameaças contemporâneas e, pensando nisso, perguntamosàs crianças qual seria a Nave Espacial que elas gostariam de lançar noespaço em uma semana de atividades criativas nas quais pudemos entender seus desejos e medos e a partir daí criar novas utopias para o futuro.

Exposta durante 04 anos na Escola Municipal de Astrofísica do Planetário doIbirapuera, essa nave dos sonhos das crianças quilombolas germinou, cresceue se deteriorou, ou seja, fez o seu percurso imaginário completo e retornou à Terra iniciando um novo ciclo na Terra Indígena do Jaraguá, onde foi queimada dentro de uma casa de rezas, com a presença da Xejari Virgínia Veríssimo.

REVISTA EXTREMOPHILIA - SUBJETIVIDADE, ARTE E CIÊNCIA ESPACIAL

Da fusão do latim extremus (extremo) com o grego philya (amor), amor Ao/Ou no extremo, o termo também indica a capacidade que certos microrganismos (extremófilos) tem de existirem em ambientes de condições improváveis: temperaturas radicais de frio ou calor, salinidade exagerada, regiões abissais, falta de gravidade, hipergravidade, zonas bombardeadas com altos níveis de radiação, zonas vulcânicas, geleiras, fundo do mar... Essas pequenas formas de vida têm sido protagonistas das mais variadas investigações exobiológicas. São assíduas nos vôos espaciais, produzindo suas nano colônias dentro de foguetes, satélites, rovers.  Elas sobrevivem a tudo e, desde que são capazes de resistir às viagens interplanetárias - cientistas espaciais insistem na possibilidade delas saírem da terra disseminando a vida universo afora.

Para além dos domínios de bactérias e archaes, propomos o conceito de extremøphilia nos remetendo ao pensamento cosmopolítico, abrangendo as políticas radicais da atualidade, as identidades de gênero, raça, classe, os processos migratórios forçados, as ameaças climáticas prementes, a globalização corporativa. Nesse cenário de pressão civilizatória, nos vemos atravessados por um programa desenvolvimentista que promove com tenacidade sua sociedade ideal - individualista e hiper vigiada. Seus tentáculos tentam alcançar todos os substratos, da matéria à psiche, estendendo suas ocupações  intraterrenas e orbitais, em busca de mais informação, poder e controle. Entretanto outras formas de vida resistem, como os seres extremos que sobrevivem de forma autônoma, populando as beiradas desses sistemas e ambientes, alheios ao antropoceno e seus apocalipses.

A Revista Extremophilia foi publicada na 6ª edição da REVISTA DAS QUESTÕES do departamento de filosofia da Universidade de Brasília (UNB).

CURADORIA E DIREÇÃO GERAL
Fabiane M. Borges
Eduardo Duwe

PRODUÇÃO EXECUTIVA
Marcia Reverdosa

PRODUÇÃO
Yasmin de Araújo
Ana Flávia Carvalho

ASSISTÊNCIA DE PRODUÇÃO
Nathaly Boscatto

DESENHO SONORO
Kako Guirado

LAB CAMPO ELETROMAGNÉTICO
Lucas Bambozzi

PROGRAMAÇÃO CINE SCI-FI
Rafael Frazão

CENOGRAFIA
Keila Costa

IDENTIDADE VISUAL
Simon Fernandes

COMUNICAÇÃO VISUAL
Rafael Frazão

PRODUÇÃO DE ROUPAS
TSAAAA

OPERADOR DE ÁUDIO
Fernando Yamamoto

EQUIPE DE FULLDOME
Fulldome Mapping
VJ Roger S.

Operação Fulldome
VJ Ulster

Integracão FullDome
Pedro Zaz

TÉCNICOS DE VÍDEO
Christhian Lins
Pozzi Trev

AGRADECIMENTOS A TODA A EQUIPE DA UMAPAZ E DOS PLANETÁRIOS DE SP
Neire Fonseca de Abreu / Fernando Nascimento / Otávio Dias / João Fonseca /
Paula Yukiko / Dorinha Almeida / Raphael Malagoli / Daniel Altman / Thiago Inacio / Dinah Allen / Guilherme  Menezes / Flavio Bianchini / Bruno Santos de Lima / Carlos Orsi

TRADUÇÃO
Matheus de Simone (GAE/EBA/UFRJ)

AGRADECIMENTOS PELA CONSULTORIA E EMPRÉSTIMO DOS METEREORITOS
Paulo Matioli / Gabriel Gonçalves / Carlos di Pietro / João Fonseca

AGRADECIMENTOS A TODA A EQUIPE DO CASP E BRAMON

APOIO
Tenonderã Ayvu
United Vjs
Panasonic
Museu de Ciências Naturais Joias da Natureza
VisualFarm
Dahaus
GAE
Nano
PPGAV
Goethe Institut
Mac-USP
Planetário de São Paulo
Umapaz
Prefeitura de São Paulo